
Este é um documentário nos (re)apresenta um grupo que se tornou símbolo da contracultura dos anos 1970. Escrevo sobre eles para tentar organizar em mim o impacto que o documentário, dirigido por Tatiana Issa e Raphael Alvarez, me causou. Eu tenho algo de Dzi Croquettes e quero descobrir o que isso quer dizer... O documentário nos revela a importância histórica da existência dos Dzi Croquettes no cenário brasileiro como um confronto a ditadura militar. Em uma época de autoritarismo irrestrito e governabilidade por Atos Institucionais que são formas de demolir a democracia e instituir enrijecimentos à expressão da cultura coletiva. Os militares cerceavam muitas peças de teatro, filmes de cinema, letras de músicas e toda expressão considerada uma ameaça ao regime. Porém os Dzi Croquettes fizeram um confronto aguerrido ao regime.
Naquela época muitos estudantes buscaram mudar o cenário político com armas e métodos de guerrilha para resolver a questão da ditadura e, com isso, foi aumentada a pressão do regime sobre os brasileiros. O grupo Dzi Croquettes “cofrontaram” o rigor do regime militar em um modo sinuoso, irônico, artístico e inteligente. Com seus espetáculos produziram modos de pensar com liberdade e criaram, com isso, um tipo de cultura e subjetividade que continha liberdade de expressão e vitalidade dos corpos em movimento. A grande revolução se produziu no pensamento, no sentimento e corpo das pessoas que foram tocadas pelos espetáculos. No palco podiam ser vistos homens de barba e pernas cabeludas dançando e cantando maravilhosamente bem e de modo escrachado. Porém com um visual completamente deslocado do que era, e ainda é, considerado uma figura masculina. Eles usavam sapatos de salto alto, seus rostos eram pintados de um modo que mais parecia um misto de “drag queen”, palhaço e mulher extravagante. Uma subversão em plena ditadura que os militares não tinha inteligência para detectar. Os Dzi Croquettes usavam roupas femininas sensualíssimas e formavam personagens de uma família com mãe, pai, filhas, sobrinhas... Nem homens, nem mulheres, Dzi Croquette: pura sensualidade e arrebatamento vital.
Nos palco podia ser visto corpos vivos e detentores de uma vitalidade e desejo de dançar, de expressar, de compartilhar vidas, revelar talentos e muito mais... O grupo se tornou a marca de uma geração e de uma revolução que se fez no silêncio e ressoou pelos tempos. O grupo marcou muitos artistas e criaram novos modos de fazer arte. O sociólogo Boaventura de Souza Santos em seu texto no Jornal o Globo “Grito de Revolta contra a injustiça” diz que não há emancipação sócial, o que há são emancipações sociais unidas e resume assim: “temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza, temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza”. Segundo o filósofo a arte afirma o seu poder revolucionário na medida em que colabora com este projeto (de igualdade e de diferença). E isso foi que o grupo Dzi Croquette trouxe, a beleza da diferença, o desejo pela igualdade (foram muito imitados) e de traduzir de um modo singular a alegria. Eles nos ofereceram espelhos que tocaram nossas almas e imprimiam uma nova estética. Não da arte que praticavam, mas da expressão vital que podemos exprimir quando conseguimos ser inteiros e humanos.
Anita Rink
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